O estado de saúde da ex-primeira dama Marisa Letícia, internada no no Hospital Sírio Libanês em São Paulo, trouxe à tona questões sobre ética médica. Foram divulgadas por Whatsapp informações sigilosas sobre o seu quadro clínico. A mulher do ex-presidente Lula teve sua morte cerebral confirmada na última quinta-feira (03) em decorrência de complicações causadas por um AVC (Acidente Vascular Cerebral).
Marisa Letícia deu entrada no hospital no dia 24 de janeiro. De acordo com o jornal “O Globo”, as informações foram divulgadas pela médica reumatologista Gabriela Munhoz de 31 anos em um grupo no Whatsapp composto por outros médicos colegas de faculdade. Nas mensagens, Gabriela havia confirmado que Marisa estava no pronto-socorro com diagnóstico de AVC hemorrágico de nível 4 na escala Fisher, um dos mais graves, e que seria levada para a Unidade de Terapia Intensiva.
Em nota, o Hospital Sírio Libanês afirmou que tem uma política rígida relacionada à privacidade de todos os seus pacientes e repudia a quebra de sigilo por qualquer profissional de saúde. “Por não permitir esse tipo de atitude entre seus colaboradores, a instituição tomou as medidas disciplinares cabíveis em relação à médica, assim que teve conhecimento da troca de mensagens.” Gabriela Munhoz foi demitida do hospital.
Segundo o jornal “O Globo”, a informação compartilhada viralizou em outros grupos de Whatsapp, e contou inclusive com imagens de uma tomografia atribuída à Marisa Letícia com informações sobre seu estado de saúde.
Discurso de ódio entre os médicos
Além de divulgar informações sigilosas, a troca de mensagens revelou também o discurso de ódio por parte dos médicos integrantes do grupo do Whatsapp. Segundo apurou o jornal “O Globo”, um colega de Gabriela, o médico residente em urologia Michael Hennich disse “ainda bem” quando Gabriela teria dito que Marisa Letícia ainda não havia sido transferida para a UTI.
Procurado pelo jornal, ele disse que não havia ironizado a situação, mas sim um erro cometido pelo corretor ortográfico do celular de Gabriela ao registrar a sigla “URO” de urologia ao invés de “UTI”
Um outro médico, o neurocirurgião Richam Faissal Ellakkis usou as seguintes palavras para se referir à situação de Marisa Letícia: “Esses fdp vão embolizar ainda por cima”, referindo-se ao procedimento de fechar um vaso sanguíneo para diminuir o fluxo de sangue em determinado local. “Tem que romper no procedimento. Daí já abre a pupila. E o capeta abraça ela”, escreveu Ellakkis.
Diretrizes éticas
O código de ética médica diz que é vedado ao médico “revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento do paciente, por escrito, do paciente”.
Em nota o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo – Cremesp disse que o exercício da medicina deve respeitar e preservar todos os aspectos do doente: físico, emocional e moral, transcendendo tabus, crenças e preconceitos, em nome da fidelidade ao compromisso de tratar e cuidar de todos, sem qualquer distinção.
No dia 26 de janeiro o Cremesp havia iniciado uma sindicância para apurar se a divulgação de um exame de tomografia de Marisa Letícia teve a participação de médicos ou se era do conhecimento da diretoria técnica ou clínica da instituição responsável pelo atendimento.
Nesta quinta-feira, 02, o órgão informou que abriu uma nova sindicância para apurar a divulgação de novos dados sigilosos referentes ao quadro de Marisa Letícia. A sindicância tramita em sigilo processual e também investigará supostas ofensas à ex-primeira-dama que teriam sido praticadas por médicos paulistas em redes sociais.
Falta sensibilidade dos profissionais
Para o médico e professor de ética médica e bioética do curso de medicina da Universidade Santo Amaro, Clovis Constantino, que também é diretor da Associação Paulista de Medicina, valores como empatia, humanidade e controle das emoções são fundamentais para o bom exercício da medicina. “Infelizmente muitos médicos e estudantes de medicina se preocupam em ter um currículo invejável e não entendem que isso só tem valor se for colocado em benefício do paciente”, ressalta.
Ele acredita que um dos fatores que leva a uma má prática da medicina começa na formação dos profissionais. “Atualmente existem muitos cursos de medicina sem condições de ensinar, cobrando mensalidades elevadíssimas, mas sem ter um corpo docente capacitado. Muitas faculdades não têm em seus currículos o ensino da ética, da bioética e humanidades”, alerta.
As consequências da falta de humanização do paciente pode fazer com que os médicos adotem atitudes incorretas no exercício de sua profissão.
Constantino ressalta que é importante que o conceito de empatia com o paciente, ou seja colocar-se em seu lugar, esteja sempre presente na formação de estudantes, residentes e corpo clínicos das instituições médicas. Além disso, são necessárias medidas de elaboração de protocolos institucionais para a fiscalização efetiva da conduta dos profissionais.
Consequências
O código de ética médica prevê aos os médicos aos quais se comprova culpa a possibilidade de punição que vai desde advertência até eventualmente a perda do registro profissional.
FONTE: Minha Vida